Um dos maiores desafios que se colocam hoje às democracias liberais é a ideia que uma resposta adequada à crise ecológica que vivemos não é compatível com a lentidão dos processos democráticos. Precisamos, dizem alguns, de mudar para regimes políticos mais autoritários – as chamadas biocracias - que nos permitam sobreviver. As três conversas deste curso servirão para pensar como salvar a ideia de democracia do perigo de extinção através de uma reflexão social e política que, assumindo completamente a realidade da crise ecológica, não prescinde dos princípios democráticos como via para a resolver.
Este curso será apresentado exclusivamente em formato presencial.
P. Manuel Cardoso SJ
Jesuíta desde 2006, concluiu um mestrado em Teologia no Centre Sèvres e outro em Estudos políticos, na EHESS, Paris. Concluiu, recentemente, um doutoramento sobre as políticas públicas de Thomas Hobbes, também na EHESS. Foi diretor-adjunto da revista Brotéria entre 2019 a 2024, e é atualmente diretor-geral da Brotéria.
Programa
Dia 1 — Que desafios coloca a transição ecológica às democracias?
Partindo do artigo de João Cardoso Rosas, “Seres humanos, animais ou natureza” (Brotéria 189, 2019) começaremos por estabelecer vocabulário para as diferentes correntes políticas ligadas à ecologia política. Depois, pegando num diálogo entre Alice e o Presidente da Câmara de Lião no filme Alice et le Maire, de Nicolas Pariser, 2019, perguntar-nos-emos se ainda podemos pensar a ação pública em termos de progresso, ou se a política é hoje exclusivamente a gestão da penúria.
Dia 2 — À espera dos bárbaros
Tal como no romance de J. M. Coetzee, a utilização do “medo do que vem aí” tem sido um recurso recorrentemente usado por agentes políticos que instrumentalizam a crise ecológica para atacarem a democracia liberal. Centrar a nossa atenção na análise serena de algumas estratégias políticas de criação de medo do fim do mundo é assim uma tarefa incontornável no caminho de encontrar alternativas à falsa dicotomia entre sobrevivência e democracia. Também o terrorismo ecológico será abordado sob o prisma histórico desde o Unabomber até hoje.
Dia 3 — O que seria uma “biocracia”?
Hans Jonas sugere que a melhor estratégia de sobrevivência seria implementar uma “tirania simpática”. Bruno Latour gostaria de criar o “Parlamento das Coisas” – com deputados não humanos representados por “especialistas”. Dominique Bourg quer dar às ONGA (Organizações Não-Governamentais de Ambiente) o direito de veto das leis promulgadas pelas instâncias democráticas. Estas e outras propostas de biocracias, todas gozando de uma certa popularidade na literatura política atual, merecem ser analisadas serenamente sob um prisma democrático.