A grande retrospectiva de Mark Rothko na Fondation Louis Vuitton oferece um itinerário espiritual da cor que nos evidencia como uma obra, ou a obra, de um grande pintor pode ser a soleira para um caminho interior. Elevar a pintura ao campo da poesia e da música foi o exercício constante e obsessivo de um homem expatriado, que procurou na plasticidade uma virtude que da realidade concreta ofereceu apenas vislumbres. O trabalho dos intangíveis, a luz contida na violência e a exponencial caminhada até à abstração na obra de Rothko culmina numa noite: a noite onde os mitos e a magia tomam conta do bosque, a noite onde sonhamos numa noite de Verão, onde vida e a morte se jogam sob olhares atentos, mas velados. «If people want sacred experiences they will find them here. If they want profane experiences they’ll find them too.»
Afirmar a doutrina, com a preocupação primeira de recordar que não muda, e testemunhar profeticamente a força vital do Evangelho num contexto cultural marcado pela vertigem da mudança tem contornos de dilema para a Igreja. Se não pode dispensar-se de ler criticamente os movimentos e os contornos do tempo presente, a história ensina que sempre que quis garantir a sua identidade combatendo e protegendo-se das mudanças culturais, perdeu e perdeu-se. A missão da Igreja e o seu alcance profético passam pelo ofício de tradução da força do Evangelho em formas existencialmente marcantes e culturalmente significativas. É também assim, como ato plural de atenção ao Evangelho e à complexidade da experiência humana, que a Brotéria compreende a sua missão e que, de diferentes formas, a procura realizar. O desassossego e a incompletude são assumidos como traços de um modo de fazer e de pensar.
Apesar das inúmeras críticas quanto à ineficácia da ONU e aos seus bloqueios, esta continua a ter um papel crucial nas dinâmicas internacionais. Nela parecem estar depositadas as expectativas da humanidade relativas à paz e à estabilidade internacionais. E, contudo, tais esperanças parecem constantemente goradas. Por isso, tendo em vista o recente e inegável aumento da instabilidade internacional, importa perguntar se a ONU tem mesmo um papel relevante na defesa da ordem internacional e por que deve ser reformada. Paradoxalmente, em circunstâncias difíceis e por entre rivalidade crescente, o contexto mais volátil em que vivemos poderá incentivar os Membros Permanentes do Conselho de Segurança a baixarem as suas cautelas e a avançarem com as reformas. Sendo urgentes, espera-se que seja possível concretizá-las.
Nas últimas décadas, surgiram várias iniciativas com o objetivo de propor modelos económicos e abordagens diferentes do foco tradicional no crescimento económico a que a Economia parece estar votada. Tal movimento chegou também ao meio académico, onde há cada vez mais iniciativas que promovem a crítica e a reflexão sobre a economia atual. Uma delas é a formação lançada pelo Centro Fé e Sociedade da Universidade de Friburgo, pensada em conjunto por economistas e teólogos. Tem por título “Economia Integral” e propõe-se redescobrir o objetivo fundamental da Economia, enquanto ciência económica, e do espírito empresarial e reconhecer o papel significativo da Fé e da Teologia na definição da realidade e dos processos económicos. Quer do ponto de vista da ciência quer da realidade, uma Economia Integral é uma economia que recupera as suas raízes humanas e que, no diálogo com a Fé, a Ética e a Sustentabilidade recupera sentido, valores e ajusta o rumo.
Para falar de liberdade, importa distinguir entre liberdade de ação ou liberdade física e liberdade da vontade que lhe pré-existe enquanto liberdade de decisão. A primeira tem antes de mais uma dimensão vertical, pautada pela relação entre o cidadão e o poder instituído. Mas claro que comporta ainda a dimensão horizontal que respeita ao relacionamento entre cidadãos. Propõe-se uma breve reflexão sobre o mecanismo psicológico que preside à decisão e, portanto, à liberdade da vontade. Tenta-se superar a antinomia entre liberdade e determinismo causal. Prossegue-se, caracterizando o conteúdo daquilo a que chamamos liberdade humana bem como o corolário da responsabilização pelo que se decidiu fazer. Depois, aborda-se a questão de saber em que medida é que temos de aceitar os atos livres dos outros, a atitude perante a diferença, a questão dos limites da tolerância. E a perspetiva tanto pode ser jurídica como moral.
A “crise dos abusos” na Igreja tornou urgente a revisão da ética sexual católica. Herdeira de uma longa história, vê-se hoje enrijecida num sistema normativo que deixa espaço reduzido para o discernimento da consciência e para a consideração de uma grande diversidade das situações. É importante, por isso, regressar a uma leitura rigorosa da Bíblia e não hesitar em recorrer às ciências humanas que chamam à atenção para a complexidade desta dimensão da existência humana.
O tema das bênçãos de pessoas do mesmo sexo voltou com intensidade e paixões ao debate eclesial com a publicação de Fiducia supplicans pelo Dicastério para a Doutrina da Fé, no dia 18 de dezembro de 2023. A resposta que tinha sido dada pelo Responsum, a 22 de fevereiro de 2021, de que a Igreja não dispunha de poder para abençoar tal realidade, se poderia calar a pergunta, não anulava a realidade. Talvez a própria pergunta sobre o poder que a Igreja tem ou não tem para abençoar pudesse ser substituída por outra sobre o poder que o bem real ou possível tem sobre a Igreja e, se quando é reconhecido, mesmo se em lugares inauditos e fora da regra, não deve ser abençoado. O registo binário dentro/fora, ordenado/desordenado, lícito/ilícito parece revelar-se insuficiente para atender com cuidado pastoral a realidades existenciais e relacionais novas. Bendizer não é da ordem do poder ou do juízo mas do reconhecimento.
Nomeada palavra do ano em 2016, “pós-verdade” tem sido objeto de muitas e variadas análises. No nosso contexto, Henrique Raposo, num artigo recente publicado no semanário Expresso, defendeu uma tese tão interessante quanto ousada. Está tudo dito no título: “O novo fascismo tem um nome: pós-verdade”. Explorando esta tese, procura-se defender a perspetiva realista, cuja noção de verdade diz respeito a uma correspondência entre o que eu penso e os factos objetivos, cuja realidade é independente de qualquer construção subjetiva. Por um lado, argumenta-se só ser possível falar em “pós-verdade” a partir dessa conceção realista. Por outro lado, defende-se que essa conceção realista abre espaço ao diálogo fraterno entre pessoas de diferentes ideologias ou credos.
Dimensões
15 x 23,4
Nr de páginas
98
ISSN
0870–7618