O movimento do 25 de Abril não fundou a democracia, nem estabeleceu os principais parâmetros de organização da sociedade e do Estado. Derrubou os poderes ilegítimos, permitiu a liberdade, derrubou obstáculos e barreiras à decisão popular e garantiu o respeito pelas escolhas da população. Não é possível, nem interessante, responsabilizar o 25 de Abril por tudo quanto ocorreu desde então. Nem sequer avaliar esse acontecimento através de uma análise do que se passou depois. É verdade que, muitas vezes, o início marca o caminho e a chegada. Mas, na evolução histórica, os factos são diferentes. Os cidadãos portugueses adquiriram, desde então, direitos e meios que lhes permitiram escolher e decidir o que pretendiam. As decisões tomadas não dependem do 25 de Abril, mas, sem aquela data, não tinham sido possíveis.
Com 50 anos de democracia, escolhe-se intencionalmente o recorte da realidade, em arquivo aberto e vivo. A opção de trazer imagens de Nuno Félix da Costa está diretamente relacionada com o desejo de encontrar o tão necessário momento de imaginar. Elas não são material etnográfico, nem procuram o rigor da tese; não querem um antes e um depois que impressiona, mas, sim, expandir as possibilidades da imaginação, para que lhes demos o nosso corpo, devedores que somos de gestos e de palavras herdadas. O contrário disto poderia ser a ingratidão do esquecimento.
Desde a proclamação do Estado de Israel, em 1948, querendo-se acreditar que se satisfariam as ambições e as necessidades da comunidade judaica e que se garantiria convivência pacífica entre os povos de Israel e da Palestina, a tragédia da guerra não cessou de fazer sofrer aqueles dois povos, às mãos uns dos outros, e os povos dos países vizinhos. As responsabilidades dos vários intervenientes e decisores podem ter sido apagadas pelo tempo, mas não se pode deixar de reconhecer que persiste um Estado opressor e um povo sem Estado, oprimido, com muitas gerações cada vez mais radicalizadas. Tudo o que tem acontecido, desde há meio século, entre Israel e a Palestina, conta com a cumplicidade de países como os EUA e alguns europeus, agravada em hipocrisia e desumanidade desde o brutal ataque terrorista do Hamas, de 7 de outubro último, e a guerra punitiva com que Israel retaliou.
Os 50 anos da nossa democracia correspondem à presença de quem escreve na Paróquia da Mexilhoeira Grande, em Portimão, como pároco. O caminho da liberdade, reclamado por Abril mas nem sempre cumprido, quando não obstaculizado, correspondeu a iniciativas concretas de desenvolvimento social e humano, desde os anos quentes pós-revolução, então de fortíssima animosidade à Igreja, até hoje. Dá-se o testemunho de que a leitura atenta do Evangelho e o contacto com formas concretas de pobreza e de exclusão exigem um sério compromisso social e político, de que a liberdade implica a ação, de que a verdade do culto religioso implica o culto da caridade. Em cinco décadas, não faltaram afinidades pitorescas com as histórias de Dom Camillo e Peppone.
«A democracia é preciso merecê-la». Nestes termos, a reflexão do Padre Manuel Antunes põe-nos hoje perante a necessidade de relermos as suas palavras, na celebração dos 50 anos da Revolução de Abril, quando espreitam, tentações da indiferença ou do populismo imediatista. A legitimidade do voto é fundamental, mas tem de ser completada pela mediação permanente nas instituições democráticas. Os cidadãos não podem ser esquecidos ou afastados da participação; têm de ser devidamente representados e participar ativamente, devendo sentir-se legitimados. Repensar o Estado obriga a que este seja de todos e não apenas de alguns e que a sociedade se torne ativa e participada. São a consolidação e a qualidade da democracia que estão em causa.
A problemática dos abusos sexuais de menores no seio da Igreja Católica tem sido alvo de intensa reflexão. As implicações legais têm sido abundantemente exploradas. Aqui, convocam-se recursos filosóficos que possam iluminar, do ponto de vista da reflexão ética, o tema e, em particular, a questão da reparação devida às vítimas. Põem-se em confronto três abordagens éticas distintas: o utilitarismo, a ética kantiana e a abordagem de Harry Gensler, a partir do imperativo, conhecido como “regra de ouro”, «não faças aos outros o que não queres que te façam a ti». No seu conjunto, confrontam com imperativos incontornáveis que podem servir de guia para o discernimento das medidas concretas a assumir e a implementar.
À passagem de meio século sobre o 25 de abril de 1974, os historiadores procuram as mais corretas análises sobre o impacto de uma tal circunstância na vivência dos portugueses. Na função de historiador, atenta-se aqui na influência da mudança de governação no curso da historiografia, isto é, no modo de escrita da História. Dá-se especial atenção às singularidades da Região açoriana. Supõe-se a convicção da utilidade da História, já que o conhecimento do passado facilita o entendimento do presente e ajuda na projeção do futuro.
Talvez não haja, na poesia de Daniel Faria, lugar tão visitado quanto o da morte, reclamando para si uma rede de relações semânticas – o luto, a viuvez, a orfandade, a sepultura ou o cadáver – que o consagram como eixo poético por excelência. Ao leitor atento, soar-lhe-á a constância poética; quanto ao desatento, não tardará em nele tropeçar. Não se crê que sobre esta obra, tal como relativamente a qualquer objeto estético, se deva impor excessivamente o facto biográfico como sua instância hermenêutica, ainda que o texto nunca possa ser considerado à margem do pretexto que o escreve nem do contexto em que se inscreve. Morte libertadora ou liberdade para morrer? Escolhe-se habitar a morte, e não padecê-la como um qualquer mecanismo cego de redenção, mas como quem habita livremente a pergunta, a ausência, a espera e a distância.
Dimensões
15 x 23,4
Nr de páginas
114
ISSN
0870–7618